quinta-feira, 21 de abril de 2011

O velório



A noticia da sua morte se espalhou rapidamente e os preparativos foram sendo providenciados. Os telefonemas foram tantos que as linhas se congestionaram. O proclama era pequeno , lacônico: ”ela teve um mal súbito e morreu”.
O local do sepultamento foi determinado pela sentinela do cemitério que já começava a preparar o lugar para o velório.
As flores foram chegando das mais diversas floriculturas da cidade. Coroas de vários tamanhos e buquês de rosas vermelhas, amarelas, brancas. Não havia mais espaço para um botão e os aromas desses ramalhetes se misturavam e formavam um novo perfume: o cheiro da dor.
Veio a viúva da casa assombrada, se sentou e começou a chorar.Veio o moço das entregas e num canto calado se pôs a pensar.Ruidosos,vieram os amigos do bairro e com respeito puseram-se a refletir.A moçada do trabalho,arranjou um tempinho e numa folga rápida veio homenagear.Veio o jardineiro sujo de terra e com as mãos trêmulas ofertou uma rama de flores.O andarilho maltrapilho e sujo,parou para dar uma espiada.
Os passantes entraram, os curiosos ficaram, os intriguistas começaram a tecer enredos e as horas passaram.
Cinco da tarde, o carro negro estaciona em frente ao portal de ferro pesado. Um homem, vestindo um traje impecável desce do auto com um quepe debaixo do braço. Dirige-se à porta de trás e a abre.
Dentro de um vestido chamejante, com luvas brancas e sapato alto, desce a moribunda com sorriso implicante: _vocês vieram!
Sem entender, o povo que ali estava parado, ficou de olhos arregalados e as palavras escassearam.
Calmamente, ela tirou as luvas e começou a apertar as mãos dos que ali se encontravam e com um pequeno beijo na face, agradecia a presença.
Antes que pudessem exclamar de júbilo, pesar ou pânico, foi apostilando:
_Durantes esses anos, tentei reunir meus amigos para uma celebração da vida. Todos pareciam ocupados demais com seus pequenos afazeres e preocupações pessoais, que não dispunham de um pequeno tempo para confraternizar, demonstrar amor, conversar e viver. No entanto nos velórios esses contratempos não parecem exercer qualquer impedimento para o comparecimento em massa, para um último adeus. Não poderia deixar passar o tempo, sem lhes falar do amor que sinto por cada um de vocês e de usufruir no mesmo momento, a presença de todos os que amo. Portanto, já que estamos aqui, vamos festejar a dar valor aos episódios realmente valorosos: A vida!
Melindrados pelo não acontecimento da morte anunciada, se retiraram sob protestos e detestáveis termos de indiferença.
Era triste intuir que a morte lhe teria caído melhor do que a vida.
Saiu com seu vestido amassado, com o rosto pálido, como uma morta viva.

6 comentários:

  1. Eva,

    Vim conhecer o seu Boteco e gostei muito.
    O post anterior dos "modelitos" foi genial, bem humorado, criativo...
    Esse conto mostra numa visão sensivel a solidão que existe mesmo estando rodeado de pessoas.
    Gostei
    Voltarei com mais calma para desfrutar de seus escritos.

    bjo

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  2. Oie Evinha!

    Adorei o texto me fez lembrar de um filme A morte lhe Cai Bem...simplesmente lindo em mostrar que muita gente não tem tempo sequer de visitar uma pessoa ou dividir seu bem querer enquanto viva, mas depois que morre todo mundo quer ir lá "marcar" presença... o desfecho mostra a indiferença que as pessoas tem... pq ela viva a personagem não iria contar pontos que uma presença chorosa e ruidosa causaria aos demais... gostei é pra se refletir....

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  3. Lufe,obrigada pelo comentario e por pertencer ao meu boteco....estou feliz de ter tido a oportunidade de conhecer seu blog...gostei mesmo.
    Ju querida,VC SEMPRE ME DANDO FORÇA.Obrigada e bom final de semana.

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  4. Evinha,que conto triste,principalmente por ser real esse sentimento.Nunca temos tempo para os vivos e quando se morre,corremos homenagear.Dá pra pensar.Bom domingo pra você.amiga sou eu a marilia_b.lima@yahoo.com.br
    ainda não consigo postar aqui,o que preciso fazer?não dá certo.

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  5. Marilia...obrigada pelo recadinho,mas vc pode usar o mesmo endereço que usou para me seguir,dai quando vc escrever aparece seu nome. qualquer coisa me escreve.Feliz pascoa (finzinho)_

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  6. Eva Mooer,

    Pra vc ver o tanto que o pretinho é querido!

    Obrigada por embelezar meu cantinho!

    Bjo!

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