quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Miau




Primeiro dia de férias, minha bicicleta novinha esperando para o costumeiro passeio matinal. Não tinha tempo para o café de tão animada. Subi na minha azulada (bicicleta) e rumei para o universo das ruas.
Adorava  me sentir solta no mundo, poder voar pelo asfalto preto de piche, correr pela terra e procurar por lugares novos.
Na maioria das vezes fazia o percurso sozinha. Sempre me dei muito bem com meu" EU",converso com ele até hoje mas não tenho paciência para escutá-lo.
A manhã estava fresca e cheia de sol e o tempo todo para fazer nada.
Passando por uma dessas ruelas, escutei um miado de filhote.
Caçadora nata por criaturas abandonadas,parei minha bicicleta e fui ao encontro do gemido.
Era um gatinho todo branco  com a carinha mais gostosa e fofa do mundo Apaixonei-me ,foi amor à primeira vista.Embrulhei ele na jaqueta que carregava comigo e o trouxe para casa.
Meus pais não compartilhavam do mesmo amor que eu tinha pelos pequenos e já sabia que seria um problema entrar em casa com a “xereta”(nome dado as pressas por ela ficar fuçando tudo)
O meu quarto ficava na frente do sobrado. A janela dava para o jardim ,de fácil acesso. Deveria subir com ela por essa abertura e ninguém saberia da anônima adoção.
Precisava de um álibi. Contei com minha vizinha também apaixonada pelas criaturinhas.
Arranjamos uma cesta de vime . Colocamos a gatinha dentro e com a corda que estiquei do quarto amarrada na alça da cesta ,puxei-a para cima.
Xereta era pequena e muito quietinha. Com um pires de leite ela dormia a noite toda. Não dava trabalho. Pelas manhãs, esperava meu pai sair e descia com ela dentro da blusa.
Durante duas semanas  levei-a comigo passear na garupa dentro da cesta e ficamos muito ligadas.
A mascote e eu passeávamos o dia todo e cada vez que precisava entrar em casa,o processo da subida pela janela era articulado e funcionava diretinho.
Uma noite (sempre tem alguma coisa para estragar a festa), as luzes das casas apagaram, só ficando as da rua nos postes altos. Aproveitei para subir a gatinha porque já estava na hora do jantar.
Não imaginava o que as luzes de fora ao tocarem a cena poderiam fazer.
A silhueta da gatinha sendo erguida pela cesta ao meu quarto, foi totalmente desenhada através da sombra nas cortinas da sala onde o papai estava sentado.
Só escutei um grito  que vinha para o meu quarto como um raio caindo das nuvens:
"EVAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA"...
Nem tinha como esconder a assustada bichinha. Pelo tom da voz do papai,  eu sabia que  estava numa baita enrascada..
Com ela nas mãos e muitas lágrimas nos olhos, (isso costumava dar certo) desci pedindo clemência... Não adiantou. Papai me deu até o dia seguinte para arranjar outro lugar para ela.
Dormi a noite toda abraçada com a danadinha que me lambia e se aconchegava .
Chorei, resmunguei e adormeci pensando como resolver a questão.
Amava Xereta, não poderia jamais abandoná-la.
De porta em porta fui buscando um dono para ela. O que conseguia era somente irritar as pessoas que batiam a porta na minha cara.
Minha parceira de idéias descartáveis, resolveu escovar os pelos da xereta e colocar um laço para ela ficar bonita e assim um possível dono apareceria.
Demos um banho perfumado na gatinha. Secamos e a escovamos. Parecia uma gata angorá com seus pelos esticados . Fizemos um laço rosa e o colocamos na sua cabecinha branca..
Quem diria! Xereta, uma gatinha de rua, virou adereço de madame.
Se foi ou não coincidência, na primeira casa em que batemos,a jovem que saiu para nos atender olhou para a gatinha e se apaixonou. Aceitou minha mascote com carinho.
Fiquei feliz, afinal ela seria bem amada.
Quando olhei para um último adeus, vi a xeretinha sendo levada pela moça e o laço rosa era a única visão que tive dela,alem do contorno de alguns cabelinhos espetados.
O resto das férias foi dividido entre choro e recordações.
Mas nunca desanimei, tantos outros apareceram e com carinho e amor foram doados para pessoas que poderiam amá-los.
Hoje tenho os meus, os dos vizinhos e os das ruas que aparecem para um lanchinho.
Amo os animais. E que bom que não preciso escondê-los... Estão todos no meu quintal.

3 comentários:

  1. Tia, sou muito, mega, master sua fã!!!
    Não vejo a hora de comprar um livro seu nas melhores livrarias!!!
    Amo você!!!
    Giuli

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  2. Ai Eva que lindoo esse texto e sim eles estão no seu quintal e no meu kkkk

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  3. Sei bem como é essa paixão!! Já tive, ao mesmo tempo, 18 gatos em minha antiga casa (hoje moro em apartamento) e todos eram de rua, encontrados ou jogados pelo muro. Adoro esses animais!

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