segunda-feira, 12 de novembro de 2012

No domingo...





A sala estava cheia. As cadeiras colocadas de costa para a parede, não deixavam nenhum vão aparente.
Com tantas cabecinhas brancas, ficava difícil reconhecer alguém que não fosse careca.
Entrei meio confusa, abaixando a cabeça à procura de um personagem específico.
Com ar de curiosidade, fui fixando um a um dos rostos que se apresentavam ali sentado, cabisbaixos sonolentos, fitados no além.
Parecia que não encontraria a figura familiar que fora visitar, tamanha a semelhança entre aqueles simpáticos idosos.
Lá estava ela, minha querida tia. Aquela que me abrigou na infância, me encheu de carinho e atenção e com paciência de mestre, me lapidou nos primeiros traços de crayon em papel canson.
Sentada, com os braços largados no colo,  parecia não esperar ninguém.
Com um suave sussurro, segurando o soluço, balbuciei seu nome e ela tão rapidamente respondeu.
Levantou-se e procurou entre aquelas cadeiras ocupadas, um espaço para podermos conversar.
Seu rosto mais magro e seu olhar mais triste e profundo me fizeram ver seus noventa anos presos num corpo debilitado, com uma cabeça que ainda declama poesias, conta histórias, faz troças.
Com anéis e colar, unhas pintadas e tiara prateada, falou sobre política, sobre seus livros lidos e não lidos, bordados e achados.
Como tanta energia e sabedoria podiam ainda estar ali contidas, sem condições de serem aproveitadas?
As lágrimas de dor iam e vinham...
Abracei minha tia e passei o amor que eu tinha.
Antes de partir perguntei:
Tia, o que posso te trazer para o natal?
Ela, agora esperta e ativa, respondeu com uma sonoridade ímpar:
_Minha filha! Me traga um namorado.

Um comentário:

  1. Que lindo, adorei como todos que eu li, sim fiquei aqui aconchegada nas palavras quentes de tanto amor, no cuidado com as histórias e me deliciei com a energia da sua tia, quero ser assim quando crescer, bjos querida. Parabéns sempre, obrigada pela companhia e pelo afeto que transborda de você e nos toca.

    ResponderExcluir