quinta-feira, 12 de agosto de 2010

as moedas



Sábado; sem planos, sem dinheiro, sem namorado e sem apelos.
Estava pronta para passar mais um final de semana nas ruas do bairro, caminhando, quando um amigo  apareceu e me emprestou seu carro para um passeio.
Que maravilha! Teria um dia diferente.
Cheguei  no portão da casa da minha amiga buzinando o fusquinha,como se fosse uma McLaren vermelha.
Quando se gosta de aventuras, não se  pergunta, não se pensa e não se usa o condicional.Foi assim que Sueli entrou no carro; pronta para rodar comigo.
Éramos Thelma e Louise na estrada.
Por entre bancários, automóveis, ruas e avenidas
Milhões de buzinas tocando sem cessar
Ela vem chegando de branco, meiga, linda, pura e muito tímida
Lembrei da musica de Jorge Ben Jor e Toquinho,mas de tímidas não tínhamos nada.Estávamos contagiadas pelas paisagens que conquistávamos com nossos próprios pés.
Pela primeira vez  de carro nas avenidas, sem nossos pais.Duas mulheres.
Por acaso encontramos um bar que fazia sucesso na época.
Estacionamos na rua e descemos para um lanche, na certeza  de que  conheceriamos alguém especial. Na época usávamos o termo paquerar.
Aquele lanche foi único. Nos auge dos meus 18 anos, me sentia a mulher mais independente do mundo.
O que um fusquinha fez na cabeça de uma pós adolescente tentando ser gente!
Estávamos adorando toda aquela agitação, mas tínhamos que voltar para devolver o carro . Não saiba o caminho e teríamos que rodar até descobrir.
Pedimos a conta.
Sueli meia sem graça,disse que não tinha dinheiro ,se eu poderia acertar ,que ela me pagaria depois.
Comecei a engolir a seco,porque no dia anterior tinha colocado na bolsa,o suficiente para um lanche rápido.
Para não tumultuar o ambiente, fui até o toalete verificar a quantia exata dos meus trocados.
Não havia um tostão na minha carteira. Nenhuma nota, nem cartão porque não existia.
Lívida,voltei para a mesa e gaguejando, dei a noticia para Sueli.
Acho que nunca vou esquecer o rosto moreno dela perdendo a cor para um amarelo pálido.
Ficamos uma olhando para a outra como se esperássemos o sonho acabar, para acordarmos e nos levantarmos da cama.
Mas era real, precisávamos de um plano.
Não tínhamos como telefonar para ninguém e o garçom já de olho em nós.
Quando clientes foram chegando e esperando por nossa mesa,lembrei que meu amigo juntava moedas,e as deixava no porta-luvas.
Enquanto Sueli duelava com o garçom, fui correndo para o carro e abri uma caixinha cheia delas. Estava escuro e não tinha como saber a quantia.
Entrei no banheiro e fiquei na pia contando aquelas moedinhas pequeninas e como não tinha um apoio, elas caiam e se escondiam entre as portas. Acabei perdendo um montão delas.
As garotas que nesse meio tempo entravam no banheiro, riam da minha situação.
Desisti e decidi contá-las na mesa e ver no que dava.
O mais difícil foi empilhar todas as moedas no pratinho em que tinha vindo a conta. Minúsculo.
 Fomos colocando uma a uma e contando.
Para tentar amenizar a cena, coloquei a única nota de papel sobre o monte reluzente e ainda tivemos que esperar o garçom contar todas elas antes de sermos liberadas a sair.
Como costuma dizer o jornalista Boris Casoy; ”Isso é uma vergonha”.
O vexame foi enorme, Sueli e eu (acho que até que vou substituir o nome verdadeiro dela aqui)ficamos acabadas.Todos os olhares voltaram-se para nós.Pelo menos conseguimos o que queríamos;chamar a atenção dos meninos .
Seguras no carro,rimos do fiasco daquela que seria nossa grande noite,nossa emancipação.Que desastrosa!.
No final descobri que minha mãe precisando de trocados para o açougue, encontrou-os na minha bolsa e esqueceu-se de me avisar.
Quando me lembro desse acontecimento, penso em como teria terminado essa história, se não tivesse a caixa de moedas no porta-luvas.
Acho que é por isso que antes de entrar em algum lugar pago, olho duas vezes minha bolsa para conferir o dinheiro.
Mas já faz tantos anos.
Sueli! Te amo amiga.

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